Obras Incompletas

Antes do texto ‘Seu Alcides’, os esclarecimentos: Sou mestre em deixar meus ‘rabiscos’ pela metade. Não foram poucas as linhas omitidas; as palavras que teimaram comigo e fugiram do papel – vai ver, tinham algo mais interessante pra fazer do que obedecer às minhas ordens. Mas vá lá... Poderia até tentar enumerar as razões por, muitas vezes, não ter concluído as etapas - textuais, ensinadas pela tia de redação na escola; ou jornalísticas, vivenciadas, primeiramente, nos corredores da Facomb. Mas prefiro lançar mão de uma boa desculpa esfarrapada. Sabe como é... Você, toda empolgada, com caneta ou teclado à disposição, e de repente, uma pequena interrupção, o telefone que toca, o pedido de ajuda de um parente, a lembrança de um compromisso...

Eita, o almoço ficou pronto...

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Após a introdução acima – sem desenvolvimento e conclusão mesmo – coloco o ‘Seu Alcides’ em pauta pra ilustrar a minha mania por obras incompletas. Ah, só mais um aviso: seguem, junto com o texto, indicações sobre dia e local da (falta de) inspiração.

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Uberaba, 06 de janeiro de 2005 - 'escritório' do Tio Beto
Já pensou no que 45 minutos podem fazer com a sua vida? Antes que os torcedores de plantão afobem-se em dar uma resposta - aquela, sabe, que responsabilizará esta parcela de tempo pela derrota do time do coração - antecipo-me, tomo o apito do juiz e (re) conduzo o jogo. Trocadilhos à parte, vamos ao que interessa, afinal a conversa que consolidaremos a seguir tem nas salas de cinema - neste caso - um cenário muito mais sugestivo do que o oferecido pelas arquibancadas dos estádios.

Recomecemos. Três quartos de uma hora antecipados proporcionaram a mim - pessoa física, residente em Brasília, de férias na cidade natal, Uberaba, - conhecer uma pessoa especial: Alcides, pele clara, com seus 1,70, elegante, vestido impecavelmente com uma camisa de linho branco, calça azul marinho combinando com a meia, e sapatos pretos. Cupido em ação? Sinto em desapontar aos 'últimos românticos', mas o enredo aqui não segue a linha água com açúcar. Os detalhes omitidos até então podem evidenciar o caso não concretizado. Enumeremos: Primeiro, sou comprometida e muito apaixonada pelo AMOR DA MINHA VIDA ( se você lembrou do hit do Cazuza, fico feliz; era esta a minha intenção). Segundo: mesmo se fosse solteira, há uma incompatibilidade básica; bem, pelo menos para mim, que graças à Deus, sou conservadora em determinadas situações: Alcides, ou melhor, Seu Alcides (meus pais sempre me ensinaram a tratar com respeito as pessoas mais velhas) tem idade para ser meu avô, 80 anos.

Curioso para entender este encontro de gerações e as circunstâncias temporais e espaciais que o envolveram? Então, vamos lá, numa linha cronológica, sensata, sem idas e vindas - exatamente o contrário de tudo o que fiz até agora.

Noite gostosa em Uberaba, esta do dia seis de janeiro. Clima ameno, ideal para ir ao cinema caminhando pelas ruas da cidade. Melhor ainda perceber que os nossos passos (sem o estresse, a correria do dia-a-dia) conseguem chegar ao local almejado em 10 minutos. Ah, as companhias! Quase esqueço de falar que, acompanhando o andar dos meus tênis novos, estavam mais dois pares de sandálias: o da minha irmã do meio e o da minha prima.

Conversa boa durante todo o percurso e chegada 'prevista' dentro do horário no Cine São Luiz, às 20h45. Abro um parêntese agora para explicar as aspas digitadas há uma linha atrás: segundo as informações da minha irmã, o filme começaria às 21 horas. Pena que o horário no cartaz teimou com ela: apontava, com números em negrito, 21h30. A solução: ficar esperando, por 45 minutos, a sessão do filme.

A próxima seqüência da narrativa não é nada difícil de adivinhar: é neste exato momento que conhecemos Seu Alcides. Na verdade, que conversamos com ele. Afinal, contatos preliminares já haviam sido estabelecidos com o homem que desde 1949 controla a entrada do primeiro cinema de Uberaba. Seu Alcides recolheu, com certeza, muitos tickets da família Lacerda. O equívoco do clã? Não ter percebido que a história de vida dele podia ser muito mais interessante do que o roteiro que nos aguardava nas telonas do cinema.

Erro reparado, diálogo iniciado. Com um tom de voz sereno, Seu Alcides discorre sobre fatos cotidianos. Somos premiadas com estórias que poderiam render Oscars, e digo, em diversas categorias. Ele gaba-se - com razão - de nunca ter pagado uma sessão de cinema. Já foi reconhecido em terras mais remotas, pelo menos alguns quilômetros consideráveis distante do local de trabalho. Na praia de Guarapari, foi identificado carinhosamente como 'o careca do São Luiz'.

Sobre o emprego, é enfático ao responder porque há 56 anos - e mesmo aposentado - bate ponto no São Luiz. "Minhas filhas, isto aqui é melhor do que a minha casa". Até como free lancer na sua área trabalhou: estava em visita à sua filha mais velha, que mora na Capital Federal, e deu uma passadinha no Cine Brasília. O responsável pela catraca do cinema queria ir à Goiânia, e Seu Alcides, prestativo, topou ficar no lugar do colega.

P.S: texto incompleto, vou entrevistar o cara para ter mais histórias...

- a altura e a idade do Seu Alcides, descritas no texto, baseiam-se em impressão.

Comments

fhaldhflkalfak said…
Me surpreendo a cada dia com você. Juro, nunca duvidei da sua capacidade, mas desconhecia este teu lado escritora.
Supimpa!!!
O problema é que a partir de agora, a atualização deste teu blog deverá ser diária, afinal, ficaremos cada vez mais sedentos dos teus textos.
Preciso dizer que te amo?
Bjão, TM.
Anonymous said…
OIEE!!!!
quem diria que um par de sandalias apressada renderia uma história dessas hein?
HEHEHE
bjão renata